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/Nelson Maculan: a trajetória de um cosmopolita do interior

Nelson Maculan Filho nasceu em Londrina, Paraná, em março de 1943. Notívago, amante das Letras e de cidades barulhentas, se notabilizou por duas características nem sempre conciliáveis: atuação acadêmica e política. Professor do Programa de Engenharia de Sistemas e Computação da Coppe, Maculan, já orientou 160 dissertações de mestrado e 66 teses de doutorado, publicou 120 artigos em periódicos nacionais e internacionais e mais de 100 trabalhos em anais de congressos.

Docente da Coppe desde 1971, tem dado importante contribuição à Educação ao longo de sua trajetória acadêmica. Foi diretor da Coppe, de janeiro a julho de 1990, Reitor da UFRJ, de julho de 1990 a 1994, Secretário de Ensino Superior do Ministério da Educação, de 2004 a 2006, Secretário de Estado de Educação do Rio de Janeiro, de 2007 a 2008.

Primeiras lições foram aprendidas em casa

Ingressou na escola já na terceira série do primário. As primeiras lições foram aprendidas em casa, com sua mãe, Edda Maculan. “Na escola minhas notas eram péssimas. Só escapava em matemática e em português, mas meu desempenho em geografia e em história comprometia a média no boletim”, revelou.

Por outro lado, Maculan tinha uma função estratégica na sala de aula, onde era uma espécie de 'guardião do tempo'. "Eu sentava ao lado da janela, com uma vista privilegiada para o relógio da catedral, e dava o alerta para a turma quando se aproximava o final da aula. Ninguém usava relógio naquela época. Eu era o cara mais importante da turma, era quem controlava o tempo”.

Em 1959, o então adolescente veio morar com a avó no Rio de Janeiro para terminar o científico, atual Ensino Médio. A mudança abriu novas perspectivas para o jovem que, até então, não pensava em ingressar na Universidade. “Penso no que seria minha vida se não tivesse vindo para o Rio, nas pessoas e nos lugares que tive oportunidade de conhecer. A cidade me abriu o mundo”.

Os pais, Edda e Nelson Maculan, foram os grandes incentivadores. Naquela época, não havia universidade no Paraná, o mais comum era a pessoa acabar a escola e começar a trabalhar. “Minha mãe estudou até o primário e meu pai até o ginásio, mas eles tinham visão e valorizavam o estudo. Fui o primeiro da família a entrar para a universidade.”

No Rio, preparou-se para o vestibular. “Minha opção era fazer matemática pura e não engenharia, mas meu pai não queria que eu me tornasse professor”. Acabou optando pelo curso de Engenharia de Minas e Metalurgia da Escola Nacional de Minas, na Universidade de Ouro Preto, onde graduou-se em 1965.

Graças ao olho clínico do professor Giulio Massarani, um dos pioneiros da Coppe e da pós-graduação no Brasil, Maculan veio para a Coppe em 1966. Era uma época em que os professores da instituição faziam incursões em universidades brasileiras e latino-americanas à procura de estudantes para cursar o mestrado. Maculan cursaria então o mestrado em Engenharia Metalúrgica e de Materiais.

Do Brasil para a França: mudanças de plano no governo militar

O clima de repressão no país o levou a embarcar para a França, país que considera sua segunda pátria, para cursar o mestrado. O ano era 1966. A França vivia uma verdadeira revolução cultural, política e social. Sua vida deu nova guinada e ampliou os horizontes. Em Paris conheceu Anne Marie Maculan, sua esposa até hoje. "A estadia na França abriu meus horizontes, me propiciou uma formação ampla. Estudei matemática aplicada, estatística e naquele período já trabalhava com computação. Em 1967, concluí o mestrado em Estatística Matemática pela Université Pierre et Marie Curie, em Paris (França).

Na volta ao Brasil, em 1971, pensou em prestar concurso público, mas o processo de seleção baseado na orientação política desanimou-o. Ao saber que o professor Alberto Luiz Coimbra queria falar com ele, vai até a Coppe, ainda no prédio da Praia Vermelha. "Tive uma recepção fria. Fui recebido de costas pelo professor Celso Rena Souza, que me disse de cara não gostar de pesquisadores com formação europeia.”

Mas a resistência durou pouco. O professor Coimbra logo o incluiu no Programa de Engenharia de Produção e Maculan conquistou seu próprio espaço. Nesse período, funda o departamento de Matemática Aplicada, no Instituto de Matemática da UFRJ, integra o grupo de fundadores do mestrado e doutorado em estatística e trabalha para o reconhecimento junto ao MEC do doutorado do Programa de Engenharia de Sistemas e Computação (Pesc) da Coppe.

Na Coppe, lecionou disciplinas nas áreas de computação, análise e cálculo numérico. A experiência na França foi de grande valia. "Naquele tempo não havia curso de computação como hoje, não havia ciência da computação. Nunca cursei essas disciplinas. Fui aprendendo enquanto fazia.” Maculan também ministrava aulas de cálculo e estatística nos cursos de Arquitetura e Ciências Sociais. A integração com alunos da graduação proporcionou uma visão geral da universidade e o tornou mais conhecido dentro da instituição.

Política universitária e Reitoria

Logo veio a atuação na Associação de Docentes da UFRJ (Adufrj). Junto com os professores Luiz Pinguelli Rosa e Alexandre Magalhães promoveram grandes debates em torno do papel da universidade, acompanhando as primeiras greves de professores. “Isso me projetou dentro da Universidade, principalmente, junto à graduação. Minha atuação política sempre esteve ligada à educação”. Da Associação de Docentes à Reitoria a ascensão foi rápida. Com uma breve passagem pela Diretoria da Coppe, de janeiro a julho de 1990, Maculan logo assume a Reitoria da UFRJ, de 1990 a 1994. “Não queria ir para a Reitoria, estava bem na Coppe, mas resolvi aceitar o desafio”.

A gestão na Reitoria foi muito difícil no início. Ao assumir, enfrentou forte oposição do quadro técnico-administrativo. “Em pleno governo Collor, havia um período de denuncismo, mas eu tinha uma equipe muito boa”, avalia. Uma das principais metas foi institucionalizar a Universidade, trabalhando para a legalização dos cursos. Outra batalha, que ele considera perdida, era enxugar a estrutura da universidade. “A UFRJ tem 55 unidades, tem reitor, pró-reitor, decano. Acho um atraso uma Universidade desse tamanho, mas infelizmente ninguém abre mão de nada”.

Ao deixar a Reitoria, Maculan passa dez anos fora do país, lecionando na França e na Itália. Nesse período recebeu várias premiações: a Croix de Chevalier dans l'Ordre des Palmes Académiques, em 1998; a Medalha da Ordem Nacional do Mérito Científico (Grau de Comendador) da Presidência da República, em 2002; o título Honoris Causa da Universidad Nacional Mayor de San Marcos, sediada em Lima, no Peru, O título concedido em 2003 pela mais antiga Universidade das Américas reconhecimento ao seu trabalho na formação de pesquisadores e professores na América Latina.

Em 2005, vem o reconhecimento da casa. Maculan é agraciado com o Prêmio Coppe Giulio Massarani - Mérito Acadêmico 2004. “Depois de uma certa idade, ser reconhecido pelo colegas mexe muito com a gente. A Coppe é formada por professores orgânicos, que dedicaram suas vidas à instituição”. Para ele, entre os personagens mais emblemáticos da instituição estão os professores Alberto Luiz Coimbra, Fernando Lobo Carneiro e Jacques de Medina. Desde então, já recebeu mais dez premiações no Brasil e no exterior, entre 2006 e 2013. A mais recente foi o Premio Konex Mercosur: Ciencia y Tecnologia, concedido, em 2013, pela Fundación Konex, da Argentina.

Ao voltar ao país para o enterro do pai, em 2004, Maculan é surpreendido com o convite do então Ministro da Educação, Tarso Genro, para ocupar a Secretaria de Ensino Superior. “Aceitei desde que houvesse a oportunidade de promover a retomada do ensino público federal, e não apenas dar ordem ao ensino privado. Há uma população que se forma e não tem para onde ir, mas é necessário organizar isso de modo a oferecer qualidade. O ensino superior e tecnológico é um investimento alto, mas imprescindível para o país”, afirma o professor, que ocupou o cargo até 2006. Em janeiro do ano seguinte assumiu a Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro, na qual permaneceu até fevereiro de 2008.

Cosmopolita, notívago e quase atleta

Maculan é casado há 45 anos com Anne Marie, professora do Programa de Engenharia de Produção da Coppe, com quem teve três filhos: Julien, 44 anos, Berenice, 40 anos, e Sebastien, 36 anos.

Cosmopolita, Maculan diz gostar mesmo é de “cidade grande, barulhenta e poluída”. Não é à toa que adora a Cidade do México. “O México tem uma cultura riquíssima. O Museu de Antropologia de lá é espetacular.” Notívago assumido, Maculan gosta de trabalhar à noite. “Meu trabalho só é produtivo à noite. Às vezes fico em cima de um trabalho o dia inteiro e não sai nada. Quando sento para escrever à noite é que o trabalho rende”. Também é o momento do dia no qual se dedica às leituras prediletas. É admirador de escritores clássicos franceses, de latino-americanos, principalmente do colombiano Gabriel Garcia Marques, e de brasileiros como Machado de Assis e Guimarães Rosa, mas considera pequeno o número de grandes escritores brasileiros. Dos contemporâneos gosta do americano Philip Roth e do amigo Godofredo de Oliveira Neto, concorreu ao prêmio Jabuti com o livro Menino Oculto. O professor só lamenta que o trabalho excessivo o tenha afastado das salas de cinema e de teatro.

Os interesses na vida de Maculan nem sempre giraram em torno das letras e dos números. O professor de cálculo numérico arriscou também alguns passos no esporte. “Joguei futebol na juventude, cheguei a ser convidado até para treinar no Vasco”, orgulha-se. Contusões no joelho, no entanto, não nos deixam afirmar se o futebol brasileiro perdeu um ótimo cientista.

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  • Publicado em - 28/03/2014